quarta-feira, 27 de abril de 2022

O 25 de Abril e as suas Vítimas *


Sobre o 25 de Abril, afirma Carmo Afonso, na sua crónica do mesmo dia, neste jornal, que “sempre houve quem dele se sentisse vítima por ter sido despojado de património ou do poder”.

Esqueceu-se a colunista (…) de mencionar aqueles, talvez o grupo mais numeroso, que, logo a seguir ao 25 de Abril e mesmo sem serem privados “de património ou de poder”, até porque os não possuíam, estiveram na iminência de serem espoliados do mais valioso de todos os patrimónios: de si próprios, dos seus ideais de liberdade, dos seus valores, da sua concepção de modo de viver.

Os que tentaram voltar a fazer de nós os adultos-crianças que fomos durante o salazarismo, são os mesmos que agora, aberta ou sonsamente, não se envergonham do seu putinofilismo.

 

* Publicado no “Público” em 26-04-2022

 

                                                                                              

 

 

Flávio Henrique Vara

Rua Leopoldo de Almeida, 13-7 A

1750-137 Lisboa

965558202

quarta-feira, 20 de abril de 2022

Passarinhos e Flores Silvestres


Campesino irredutível, nado e criado em berças transmontanas, mas por força da minha sina a residir em Lisboa, não sou capaz de passar longos períodos na capital sem ir desintoxicar-me dos miasmas citadinos aos ares da terra onde nasci. Confesso que ultimamente cada vez que lá fui voltei mais desencantado. Aquilo já não é o que era. As coisas que mais me prendiam, que me eram mais familiares, como os passarinhos e as flores silvestres, estão em vias de extinção. As andorinhas já são em número reduzido; os chascos, as carriças e os trigueirões já são difíceis de avistar e já não nos deleitam com os seus trinados; o rosmaninho, a cheirosinha (vulgo tomilho), o alecrim, tão abundantes, no tempo da minha infância, são hoje raridades.

Estava eu melancolicamente a interrogar-me sobre qual poderia ser a causa de tais fenómenos: pesticidas, alterações climáticas? E eis que o choque foi tremendo: a causa tenho sido eu próprio. Tal revelação chegou-me via Carmo Afonso, a colunista da última página do jornal PÚBLICO:

por cada vez que alguém compara o BE e o PCP à extrema-direita morre um passarinho silvestre, seca uma flor campestre. Ao ritmo a que vamos não sobrarão nenhuns nem nenhumas (Público de 8-4-22).

Desgraçadamente, eu tenho feito muitas vezes essas comparações. Para meu eterno remorso. Eu pecador me confesso. Jamais voltarei à minha aldeia para não me deparar com os estragos que lá provoquei. Mea culpa, mea culpa, mea culpa.  

 

                                                                                              

 

 

 

                                                                                              

 

 

 

terça-feira, 5 de abril de 2022

À Zezinha e aos Meotes

 

Generosa e sempre atenta

às carências dos velhotes,

Maria José Madruga

tricotou com muito apuro

uns excelentes meotes,

muito quentes e macios

para eu não sofrer mais

o tormento dos pés frios

pelas noites invernais.

 

Mais ninguém da minha idade

entre nobres e plebeus
se poderá orgulhar

de uns meotes como os meus.

 

Meotes de tanta estima

não se vendem nos mercados
e a sua matéria-prima

é de fios de altruísmo

e amizade entrelaçados.

 

Não sei como agradecer

à Zezinha por me ter

distinguido com tal prenda;

e só para não ficar

com os pés muito quentinhos

mas com as mãos a abanar,

tricotei estes versinhos

que lhos vou endereçar

com gratidão e beijinhos.

 

 

 

                                                          

Arcades Ambo

  Rapazola petulante e tão levado da breca que pô-lo a governante não lembraria ao careca.   Lembrou, contudo, ao Monhé, per...