segunda-feira, 13 de dezembro de 2021

Pontapés Gramaticais, Pandémicos e Colaterais


            A variante mais recente do coronavírus, baptizada ómicron, ademais de agravar a pandemia, está a ser muito infecciosa, linguisticamente falando. Como é sabido, ómicron é o nome da vogal “o” do alfabeto grego, e significa “pequeno”(mícron). A mesma vogal tem ainda outro nome, ómega, ou seja, “grande”(mega). Estes qualificativos não têm aqui o mesmo significado que vulgarmente lhes damos de “minúsculo” e “maiúsculo”. Mais adequado seria dizermos “o” breve e “o” longo. A língua grega antiga era mais musical do que as línguas modernas e, tal como na música há notas com tempos diferentes de duração, o mesmo acontecia, na pátria de Homero, com a pronúncia das vogais. A vogal “o”, conforme os casos, podia ter um tempo curto de pronúncia ou ter uma duração sensivelmente o dobro da primeira; nesse caso era representada graficamente por dois ómicrons acoplados (ω).

            Tanto ómicron como ómega são palavras esdrúxulas, com acento tónico e gráfico na primeira sílaba da esquerda.  É nessa sílaba que se deve carregar foneticamente e não na última. E assim como não dizemos “omegá”, também é erróneo dizer “omicrôn”. Mas a literacia dos comunicadores da nossa praça, com particular realce para os da televisão e da rádio, anda muito por baixo, é muito “micrónica”. Com o maior desplante agridem-nos constantemente os ouvidos com “omicrôns” e outras necedades que a falta de espaço me impede de elencar. Nem mesmo quando nos ecrâs das televisões a palavra aparece correctamente escrita, com acento gráfico na sílaba tónica, eles evitam a calinada.

            De tantos tratos de polé que recebe de locutores, pivôs, comentadores, especialistas, virologistas e até, amiúde, das autoridades de saúde, a língua portuguesa já deu entrada nos cuidados intensivos. Foi difícil engendrar a vacina contra o vírus. Mais árduo será descobrir o antídoto eficaz contra o morbo asnal que atinge aqueles sandeus! Mas eu ainda não perdi a esperança; haja Deus.  

 

 


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