terça-feira, 25 de janeiro de 2022

O Poeta, o PAN e as “Tradições” *

 

O poeta Manuel Alegre (M. A.) escreveu neste jornal, em 18 do corrente, um artigo com o título “Voto PS, não voto PAN” em que perora sobre as suas preferências eleitorais, explicitando que não vota PAN para não votar “contra o que gosto de fazer, como caçar e pescar” e ainda para impedir “que dois ou três deputados acabem com a pecuária, a caça e a pesca desportiva e outros seculares costumes e tradições do povo português.” (sublinhado meu).

M.A. ,como muita gente, não distingue entre tradições e rotinas ou costumeiras. Se uma usança qualquer, só porque é praticada há muito tempo, tivesse direito ao estatuto de tradição, então pela lógica do quanto mais antigo mais tradicional, a mais antiga profissão do mundo, o meretrício, estaria entre as tradições mais veneráveis, e entre as tradições contaríamos a escravatura, o direito de pernada, a pena de morte, as touradas, as praxes académicas, etc., etc.

Sem embargo de muito apreciar a poesia de M.A. e conservar no ouvido alguns dos seus versos, mormente o seu grito contra a ditadura salazarenta – “há sempre alguém que diz não ”-, confesso que, por vezes e por alguns dos seus tiques e assomos, se me insinuou a suspeita de que no genoma de M.A. era capaz de existir algum gene marialvista. Agora essa suspeita virou certeza: M.A. diz não a certas ditaduras e sim a outras, vide, à ditadura antiecologista, à ditadura anticlimática, às ditaduras em que os animais “racionais” tiram prazer em torturar os outros.

Eu também não voto PAN, mas isso não me impede de abraçar algumas causas daquele partido que representam um avanço na caminhada humana da barbárie para a civilização. M. A. Não está pelos ajustes. Pois fique-se lá com as suas excursões cinegéticas e com as suas liberdades poéticas. Estamos conversados.  

 

 

 

(*) Enviado para a secção “Cartas ao Director” do “Público” e não publicada.

 

 

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